Continuidade da cobertura sobre o Museu Nacional ilustra como quantidade não é sinônimo de qualidade da informação

O feriado da Independência, que celebramos em 7 de setembro, tem vínculos com dois dos principais museus brasileiros, ambos inacessíveis neste momento: o do Ipiranga e o Museu Nacional. Como afirma a Folha de S. Paulo em sua edição do 196º aniversário do brado retumbante de D. Pedro I, o gesto dramático não recebeu muita atenção naquele momento, sequer aparecendo nos jornais. O jornal pondera que a Independência não foi uma conquista individual, mas um processo que se desenrolou nos anos seguintes no Palácio Real da Quinta da Boa Vista – sede incendiada do Museu Nacional, onde viviam os imperadores –, até a assinatura, em 1825, do tratado de reconhecimento da independência por Portugal.

A matéria da Folha foi a única que encontrei que aproveitou o 7 de setembro para resgatar a memória do Palácio de São Cristovão. Mas não foi a única sobre o Museu Nacional: somente no feriado, foram mais de 20 os textos publicados apenas nas edições impressas de três dos principais jornais do País – a própria Folha, Estadão e O Globo –, e, nos dias seguintes, identifiquei quase 50 outros textos nesses mesmos jornais, contrariando minhas expectativas de que o assunto esfriasse com o passar do tempo e me levando a repetir um tema em duas colunas consecutivas pela primeira vez na curta história desta Mídia e Ciência.

Dentre os diferentes olhares para o incêndio no Museu, continuou em destaque o jogo de empurra em relação às responsabilidades, com várias tentativas explícitas de caracterização da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), à qual o Museu está vinculado, como instituição ineficiente e dominada por interesses partidários em detrimento do bem público. O contexto eleitoral em parte explica essa tendência, mas o anúncio, no dia 11, da criação de uma Agência Brasileira de Museus que esvaziaria funções da UFRJ, também nos ajuda a refletir sobre os motivos por trás dessa desconstrução da gestão da Universidade. Outro assunto que recebeu grande atenção foi o processo de reconstrução do Museu. Além disso, a tragédia, como geralmente acontece, fez com que um caso particular fosse generalizado, e vários outros museus brasileiros e suas condições precárias de manutenção e segurança virassem pauta. No Rio de Janeiro, inclusive, o Ministério Público acaba de solicitar o fechamento de seis museus federais, decisão transformada em prazo de 30 dias para adequação pela juíza a quem o caso foi atribuído.

Esta última notícia ilumina a visão imediatista que em geral reina no Brasil quando um problema ganha visibilidade e gestores são questionados e instados a criar as condições para a solução. Nesses momentos, o descaso de décadas, séculos às vezes, parece passível de ser revertido em míseros 30 dias, e é impressionante como todos conhecem o caminho a percorrer, sabem o que fazer e como fazer. Se sabiam, por que não o fizeram antes, falta perguntar.

Uma dessas soluções mágicas é a tal Agência Brasileira de Museus (Abram), mais uma decisão arbitrária – e, além disso, ao que tudo indica natimorta – do governo de Michel Temer. Em que a Abram será diferente do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), que ela deveria substituir? Independentemente da polêmica sobre a origem dos recursos – que deveriam vir do orçamento destinado ao chamado “sistema S”, contra o que o Sebrae já se rebelou –, nos cabe perguntar por que não tentar aprimorar o Ibram, se há o diagnóstico dessa necessidade, e, também, se o dinheiro existe, por que ele não foi usado antes para prevenir este e outros desastres?

Nós sabemos a resposta: porque nenhum dos caminhos apontados até aqui é real, sério e comprometido com algo além da tentativa de criar uma cortina de fumaça ante assunto tão indigesto na véspera das eleições. E, se depender da mídia, não vai ser difícil ter sucesso nessa empreitada, já que o anúncio da Abram foi feito praticamente sem crítica. Além disso, no dia seguinte à notícia, estranhamente o número de matérias relacionadas ao Museu Nacional caiu drasticamente, o que é ainda mais curioso quando consideramos que, de 11 a 15 de setembro, acontece no Museu do Amanhã encontro da Associação Brasileira de Centros e Museus de Ciência, cujas discussões sem dúvida renderiam muitas pautas no contexto atual.

Aguardemos as cenas dos próximos capítulos, já que, na semana passada, fui um pouco mais pessimista do que o necessário, como revelou a continuidade da cobertura, e torço, assim, para estar errada novamente.

A gente se fala na semana que vem!