Na última segunda-feira, dia 5 de junho, celebramos o Dia do Meio Ambiente, infelizmente sem razões para comemorar. Dias antes, em 1º de junho, Donald Trump anunciara a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris sobre o clima. E, coincidentemente, no mesmo dia 5, altas temperaturas também foram destaque por um motivo completamente diferente: naquela segunda-feira, um grupo de astrônomos anunciou a descoberta do planeta mais quente já encontrado, com temperaturas próximas às do nosso Sol!

Com tanta coisa acontecendo, não foi fácil sequer acompanhar o noticiário, e mais difícil ainda escolher o foco desta edição de Mídia e Ciência. Além dos temas já mencionados, tivemos ainda artigos sobre nova detecção de ondas gravitacionais e sobre a descoberta de fósseis de Homo sapiens no Marrocos que jogam o início da nossa história enquanto espécie bem mais para trás do que imaginávamos até agora.

Enfim, uma semana agitada. Mas, mesmo considerando “apenas” o último absurdo do governo de Trump, seria tarefa quase impossível falar de todo o noticiário, já que o assunto foi destaque em todos os meios de comunicação, e durante vários dias. Por isso, optei por uma espécie de “estudo de caso” da Folha de S. Paulo, cuja cobertura me chamou a atenção por vários motivos, mas, sobretudo, pela pouca Ciência envolvida, além do viés marcantemente economicista.

No dia seguinte ao anúncio de Trump, 2 de junho, o assunto foi destaque na capa da edição impressa da Folha, com a manchete “Trump retira EUA do Acordo de Paris” e uma foto ocupando quase um terço da página. Essa imagem, junto com outras fotos usadas nos dias seguintes, é um primeiro aspecto a se prestar atenção. Nela, Trump aparece isolado, literalmente à sombra da Casa Branca, dando as costas a um grupo aparentemente estupefato – e mudo – de repórteres no momento em que se retira do discurso, feito nos jardins da residência presidencial. A escolha desta imagem certamente não se deu ao acaso, tampouco a construção da narrativa fotográfica que se consolida nos dias seguintes: nas imagens, a história que a Folha conta é a de um presidente solitário, patético, que vira as costas às evidências científicas e, mais do que isso, à opinião pública mundial e ao próprio Planeta, levando com ele para as sombras o seu país, que assim vai deixando a posição de grande líder mundial.

Ainda no dia 2, o assunto é destaque em duas editorias: Mundo e Ciência. Em Mundo, temos o relato em si do anúncio feito, com os argumentos apresentados por Trump e reações em diferentes partes do mundo. Temos também uma análise do jornalista Marcelo Leite que, além de bastante restrita ao aspecto econômico, me parece carente da apresentação de evidências que sustentem a tese de que a retirada “é mais danosa aos EUA do que ao Acordo de Paris”. Em outras palavras, aos leitores a única opção oferecida é acreditar ou não na posição apresentada, sem a chance de chegar a uma conclusão por conta própria.

Em Ciência, temos uma retrospectiva importante das negociações sobre mudanças climáticas a partir da efeméride da Eco-92, que – mais uma coincidência – se iniciava há exatos 25 anos em um dia 3 de junho. Se, de um lado, o texto é um antídoto importante à fragmentação característica das coberturas midiáticas, inserindo o Acordo de Paris em um contexto, ao mesmo tempo o modo como ridiculariza o cenário da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992 – por mais próxima do real e divertida que essa representação possa ser – também não acrescenta muito em termos de oferecer aos leitores o conhecimento disponível sobre mudanças climáticas, alternativas energéticas, ou sobre os possíveis impactos que a saída dos EUA do Acordo poderá ter sobre o controle do aquecimento global.

Nos dias seguintes, a Folha continuou tratando do tema, em um editorial no sábado e, depois, de volta nos limites da editoria de Ciência. Apesar disso, o que menos vemos são informações científicas. Na edição de domingo, por exemplo, o humor volta a imperar, com um perfil da cidade de Pittsburgh que contradiz mais uma afirmação do presidente. Novamente divertido, e até mesmo informativo, mas com pouquíssima participação do conhecimento científico. Assim, a cobertura, além de economicista, me parece falha até mesmo nesse aspecto, ao, por exemplo, praticamente ignorar as possibilidades de barateamento das energias renováveis, dependentes fundamentalmente dos investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação.

Eu poderia comentar muitos outros aspectos, mas teremos de fazer isto em outras ocasiões. Opto, neste momento, por destacar a relevância desta atenção à abordagem economicista das questões ambientais, que deixa a impressão de que o principal – ou até mesmo único – valor a ser considerado é o financeiro.

Ao fazer essa escolha, tenho a impressão de terem sido mais abundantes os assuntos dos quais deixei de tratar do que aqueles sobre os quais falei nesta edição. Assim, se você quiser saber mais sobre KELT-9b, o planeta quente do início do texto, recomendo a reportagem da Scientific American dos Estados Unidos, muito informativa, e divertida na medida. Da mídia brasileira, recomendo a notícia publicada em O Globo, que me pareceu uma das mais completas.

Já sobre as razões de não termos motivos para comemorar no Dia Mundial do Meio Ambiente, recomendo o editorial de Maurício Tuffani em seu Direto da Ciência, no qual escancara inclusive a tentativa de Michel Temer de criar uma agenda positiva na área, além de apresentar reportagens sobre um outro destaque da semana: o relatório do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas sobre impacto, vulnerabilidade e adaptação das cidades costeiras. E, por fim, recomendo muito o texto do Washington Post que fala sobre “como ensinar crianças sobre as mudanças climáticas onde a maioria dos pais são céticos”. É um relato das experiências de um professor de Ensino Médio em Idaho, Estado americano onde menos da metade das pessoas acredita na contribuição das atividades humanas ao aquecimento global. Ao fim, a reflexão de que temos falhado ao falar sobre o clima, deixando a impressão de que esta é uma briga política, na qual as pessoas não necessariamente querem se envolver… Um risco que identifico na cobertura comentada por aqui hoje.

Boas leituras, e uma boa semana.