Centenário do eclipse de Sobral será celebrado no próximo dia 29 de maio

“Revolução na Ciência – Nova teoria do Universo – Ideias newtonianas derrubadas.” “Luzes todas tortas nos céus – Homens da Ciência mais ou menos irrequietos com os resultados das observações do eclipse – Teoria de Einstein triunfa.” As manchetes – do londrino The Times e do The New York Times, respectivamente – dão uma rápida ideia de como foi recebido, em novembro de 1919, o relato da observação do eclipse total do Sol que acontecera em 29 de maio daquele ano, fornecendo a primeira prova experimental da Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein, proposta quatro anos antes. Cem anos e várias outras provas depois, a mídia não parece estar muito atenta a este momento histórico importante para o Brasil e para a Ciência brasileira, já que a cidade de Sobral, no Ceará, foi o palco do experimento que, como registram vários textos sobre o tema, mudou completamente a forma como vemos o mundo e, além disso, alçou Einstein à condição de celebridade global.

Estamos há exatamente uma semana do centenário e, na grande imprensa, não encontrei nenhum material digno de nota sobre o eclipse de Sobral. Felizmente, dois veículos especializados – a revista Pesquisa Fapesp e a publicação eletrônica do Labjor (Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo) da Unicamp ComCiência – trouxeram conjuntos de textos que permitem nos prepararmos para viver intensamente a efeméride, na próxima quarta-feira, 29 de maio de 2019.

Há vários olhares possíveis – e necessários – para o eclipse de Sobral. É importante, primeiramente, compreender o experimento e sua relação com a comprovação da Teoria da Relatividade. Neste sentido, um dos textos da Pesquisa Fapesp é a minha recomendação, inclusive por incluir um infográfico interativo que torna muito mais fácil o entendimento do fenômeno da deflexão da luz ou, como vem sendo apelidado, do que significa falar que a luz fez a curva nos céus do Brasil.

Um outro capítulo fascinante é o aspecto histórico, com seus vários subcapítulos. Temos, por exemplo, a expectativa gerada por várias tentativas anteriores de observação de eclipses, frustradas pelo mal tempo e, também, pelas dificuldades impostas pela Primeira Guerra Mundial. No própria dia do eclipse de 1919, uma segunda equipe de astrônomos ingleses que viajaram para a Ilha do Príncipe, na África, teve seus esforços muito prejudicados por um céu encoberto. O contexto da Guerra está na origem de outra questão relevante, que é a controvérsia sobre a objetividade dos resultados obtidos em 1919, já que o inglês Arthur Eddington, além de ser um partidário das ideias do alemão Einstein, aparentemente via nessa interação entre Inglaterra e Alemanha uma oportunidade de superar as tensões pós-Guerra. Também há grande interesse em saber qual foi a participação brasileira na expedição ao Nordeste do País e conhecermos melhor personagens como Henrique Morize, Diretor do Observatório Nacional naquele momento.

Por fim, um outro conhecimento importante diz respeito à continuidade dessa história, com sucessivas outras evidências da robustez da Teoria de Einstein ao longo dos anos que culminaram, no centenário, com a primeira imagem jamais produzida de um buraco negro.

O discurso sobre o eclipse de Sobral frequentemente fala em uma nova concepção do Universo derivada do trabalho de Einstein. No entanto, não é simples compreender esse impacto e, além disso, há o risco de “compreensões” pseudocientíficas, como, por exemplo, a que conclui que tudo é relativo neste mundo, levando essa conclusão a domínios distantes demais da Teoria da Relatividade. Dentre as várias características que distinguem Albert Einstein está, justamente, o compromisso de tentar disseminar suas ideias junto a não especialistas. Para tanto, já em 1916 ele lançou a publicação de divulgação científica intitulada “A Teoria da Relatividade Geral e Especial”. No livro, Einstein afirma que simplificou sua exposição para que o leitor não fosse distraído por “tantas árvores” e, assim, não conseguisse “enxergar a floresta”. Cem anos depois, minha avaliação é que o grande desafio da divulgação científica continua sendo abrir mão de algumas árvores e, mesmo assim, conseguir mostrar a floresta.

Já existem, neste momento, ao menos três livros motivados pelo centenário do eclipse de Sobral, infelizmente todos em Inglês (por enquanto): “No Shadow of a Doubt: The 1919 Eclipse That Confirmed Einstein’s Theory of Relativity”, do físico Daniel Kennefick; “Gravity’s Century: From Einstein’s Eclipse to Images of Black Holes”, do jornalista Ron Cowen; e “Einstein’s War: How Relativity Triumphed Amid The Vicious Nationalism of World War I”, do historiador Mathew Stanley. O Observatório Nacional prometeu para breve o lançamento de uma coletânea.

Os materiais que eu li até agora me estimularam a buscar mais informações, a provavelmente ler os livros e, em grande medida, é o que eu espero que o centenário e outras ocasiões como esta possam provocar nas pessoas: curiosidade e vontade de saber mais. Na manhã da próxima quarta-feira, 29 de maio de 2019, sugiro olharmos para o céu e separarmos alguns minutos para refletir sobre aquele outro 29 de maio, há 100 anos. Lembrarmos de como chegamos até aqui, das conquistas, do conhecimento que produzimos, mas também de todos os erros. E, assim, pensarmos no que é possível – e necessário – fazer nos próximos 100 anos.

Boas leituras, boa celebração, e até a semana que vem.

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Centenário do eclipse de Sobral será celebrado no próximo dia 29 de maio