Notícias da semana levantam a questão: Ciência precisa ter o seu Neymar ou estar nas milhares de várzeas espalhadas pelo País?

A divulgação do conhecimento científico e a presença da Ciência no dia a dia de cada um de nós é o tema da semana. No domingo, dia 15, O Globo noticiou um estudo mostrando que os brasileiros têm muito interesse na Ciência, mas não sabem dizer qual é o seu impacto no cotidiano. Na segunda-feira, o Instituto Serrapilheira anunciou edital voltado à formação de divulgadores e ao treinamento de professores de ciências. Para nós, no LAbI, a semana foi a do I Simpósio de Difusão e Divulgação Científica em Cepids (Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão, apoiados pela Fapesp), pelo qual aguardávamos ansiosamente há meses.

Que os holofotes estejam voltados à divulgação científica é sempre algo que comemoramos. Porém, é indispensável refletir sobre as nossas razões para acreditar que a Ciência precisa ser divulgada e, principalmente, que não nos contentemos em falar do conhecimento científico, de qualquer maneira, acreditando que, independentemente de qualquer coisa, falar de Ciência tornará o conhecimento mais próximo de diferentes grupos da população.

O estudo noticiado pelo jornal O Globo foi realizado pelo Instituto 3M em 14 países, incluindo o Brasil, com cerca de mil pessoas entrevistadas em cada país. Dentre vários outros resultados, vemos que, entre os brasileiros, 94% se sentem esperançosos e 88% fascinados quando pensam em Ciência. Ficamos sabendo também que as mesmas pessoas que acham a Ciência muito importante (83% dos entrevistados) sabem pouco ou nada de Ciência (90%!) e não identificam impactos do conhecimento científico no seu dia a dia (66%). E, curiosamente, que quase a metade das pessoas preferiria jantar com o astronauta brasileiro, Marcos Pontes, do que com Neymar, e 42% abriria mão da companhia de Ivete Sangalo para estar com Celina Turchi, pesquisadora que identificou o vínculo entre o vírus da zika e a microcefalia.

Este não é o primeiro estudo com resultados desse tipo. Pesquisas chamadas de “percepção pública da Ciência” já são realizadas há vários anos no Brasil e no mundo, comumente com resultados apontando baixo conhecimento e grande interesse pela Ciência. Eu, particularmente, sinto falta do passo seguinte, de investirmos mais na identificação dos motivos pelos quais chegamos a esses resultados.

Celebridade x proximidade

Nos comentários sobre o estudo da 3M, por exemplo, há algumas pessoas que dizem ser importante que a Ciência produza mais celebridades, como Neymar e Ivete Sangalo. Eu discordo, já que um dos motivos que dificulta a aproximação da Ciência do nosso cotidiano, que enfraquece a chamada cultura científica, é o tratamento dado a ela como algo espetacular, milagroso, obra de gênios predestinados e abnegados, ou acessível a pouquíssimos privilegiados que podem dar um passeio e ver a Terra do Espaço. Uma pesquisa de ponta, como a de Celina Turchi, que coloca o Brasil em destaque no cenário científico mundial, sem dúvida é motivo de celebração. No entanto, qualquer um que esteja próximo do lugar em que o conhecimento científico é produzido sabe como o dia a dia é muito mais semelhante à construção de uma casa, tijolo sobre tijolo em uma labuta diária de tantos, sem a qual não haveria o triunfo de alguns poucos.

Em muitas áreas fala-se, hoje, em deslocamentos de foco. Na Saúde, da doença para o paciente, o indivíduo, a pessoa e tudo que está ao seu redor. Na Educação, do professor, ou do conhecimento, para o aluno, responsável pelo seu percurso de aprendizagem. Na divulgação científica, talvez também possamos nos beneficiar de movimentos nessa direção. Na definição de nossas metas, devemos ir além das necessidades da própria Ciência, que depende do apoio popular para que haja financiamento e, também, do despertar de vocações para que haja cientistas. Pode ser muito útil pensar, cada vez mais, também nas necessidades, bem como nos desejos, e direitos, de cada pessoa no que diz respeito ao conhecimento científico. Talvez devamos também, na hora de definir o que divulgar, tentar ouvir mais as pessoas sobre o que elas gostariam de saber. E, na hora de avaliar o sucesso ou fracasso de nossos esforços, de rever nossas estratégias, de propor os caminhos futuros, usar outras métricas, talvez ainda não inventadas, que consigam medir, por exemplo, a diversão, o prazer e a satisfação resultantes da interação com o conhecimento.

Boas leituras, e uma ótima semana.

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