A Matemática brasileira – mais precisamente, a pesquisa na área de Matemática realizada no Brasil – está de parabéns: no último dia 25, foi anunciada a “promoção” do País a integrante do grupo de 10 nações consideradas as mais avançadas na área pela União Matemática Internacional.

De parabéns também estão as equipes responsáveis pelas estratégias de relações públicas neste Biênio da Matemática no Brasil (2017-2018), e eu explico por quê. Quando nós, assessores de comunicação, planejamos uma entrevista coletiva ou outro evento direcionado à Imprensa, o sentimento comumente é um pouco contraditório: de expectativa e esperança de ganhar visibilidade, e de um certo ceticismo de que isso vá, de fato, acontecer. Neste caso, aconteceu. A partir do anúncio da novidade em um evento no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), no Rio de Janeiro, a notícia foi destaque nos principais grandes veículos do País – Estadão, Folha, O Globo, Piauí e Veja, dentre outros.

Além disso, a mídia em grande medida repercutiu o próprio discurso dos responsáveis pelo anúncio. Talvez o verbo mais apropriado seja reproduziu, já que a estrutura e a linguagem das matérias são muito parecidas nos diferentes jornais e revistas, provavelmente reproduzindo o texto entregue aos jornalistas no momento do anúncio. A semelhança começa já nos títulos, que, quase sem variações, obedecem à fórmula “Brasil chega ao grupo de elite da Matemática”. Além disso, as matérias são quase todas ilustradas por fotos da sede do IMPA – que, sem dúvida, é uma instituição central para a Matemática brasileira, mas não seu único símbolo possível. Já os textos, em geral, começam com um contexto – explicando quem é a União Matemática Internacional, como os países são divididos em grupos e quais são os critérios de classificação –, para depois abordar o histórico da pesquisa brasileira na área e a sua produção atual. Por fim, temos as mesmas pessoas, fazendo as mesmas declarações. São onipresentes o Diretor do IMPA, Marcelo Viana, falando do valor do reconhecimento, e o premiado matemático Artur Ávila, chamando a atenção para os riscos nos cortes do orçamento para a Ciência. Também temos o premiadíssimo Jacob Palis, o Presidente da Sociedade Brasileira de Matemática e os representantes dos ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, os dois últimos com falas sem pé nem cabeça (confiram, se duvidarem).

A tentativa de estabelecer uma relação contraditória entre a excelência da pesquisa e os problemas no ensino da Matemática no Brasil também está nos diferentes textos, com variações. Em alguns, essa relação é apenas sugerida, de forma acidental ou, até mesmo, artificialmente. Em outros casos, apesar de algumas pistas de como uma coisa pode influenciar a outra, temos a nítida impressão de que a hipótese jornalística, ainda que não confirmada, ganhou mais destaque do que devia no texto final. Em outras palavras, que o jornalista teve uma “brilhante” ideia para a pauta na redação, não conseguiu muitas declarações ou evidências que subsidiassem essa ideia, mas estava tão apegado a ela que não conseguiu abandoná-la na organização do texto final. E temos o caso de O Globo, cuja matéria acaba sendo sobre a “precariedade” do ensino de Matemática, e não sobre a “excelência” da pesquisa na área – e que, mesmo publicando também uma coluna sobre o tema, não consegue nos dizer muito mais do que o óbvio.

Para quem se interessou, eu sugiro a leitura do texto da Piauí. Sobre essa relação, ele só nos diz que o reconhecimento da pesquisa em nada muda o quadro do ensino. Pois é; e quem disse que mudava? O texto também não traz informações ou fontes muito diferentes das outras matérias. Mas, por detalhes sutis, confere mais sentido a essas mesmas informações, e é mais “saboroso”. Um bom exercício de jornalismo comparado e, assim, de leitura crítica de mídia! Boa leitura, e uma ótima semana!